29 de ago. de 2009

Deus abençoe essa bagunça

Melhor chamar uma equipe de resgate pra achar o Da Silva aí no meio...
*
Dessa, não deu pra escapar. Já estava eu rascunhando uma pequena lista de compras (pequena mesmo, só tinha cerveja e uma peça de carne) com os itens necessários pra queimar uma carne no meu grill genérico (pela pechincha que custou, deve ser do Maguila, não do George Foreman), quando a patroa apitou e parou a jogada. Sutilmente, eu fui lembrado de uma promessa, feita alguns dias atrás, de dar uma faxina no quarto do computador, uma espécie de escritório que mantemos aqui no cafofo.
*
Eu não faço o gênero maridão sentado na poltrona com o pé em cima do móvel assistindo o futebol esperando a mulher trazer mais uma cerveja, longe disso. Costumo dar uma mão boa na hora de botar ordem no pântano, chegando até a contribuir com meus talentos na cozinha, bem acima da média masculina. Tudo bem que minha especialidade é comida de Ogro: Rabada, Feijoada, Churrasco e por aí vai. Não sei fazer nenhum foie Grass com Sauté de Alcachofras, mas fome eu não passo.
*
Eu não me incomodo de ajudar com tarefas domésticas, mas eu e a patroa temos uma sensível diferença no grau de tolerância com a bagunça, o que leva nos leva a algumas DRs que, embora sejam devidamente contornadas, enchem o saco. Tanto eu quanto ela achamos que não se deve deixar casa bagunçada, o único problema é o que cada um entende como sendo uma casa bagunçada.
*
Ela não gosta de ver coisas espalhadas pela casa, principalmente aquelas que eu sou especialista em deixar por aí, como livros, jornais e materiais da faculdade. Pra mim, bem, a casa só vai estar bagunçada quando as coisas espalhadas não me deixarem entrar.
*
As negociações sobre o grau de bagunça tolerável continuam. Já aceitei guardar o material de estudo, mas o livro do Elio Gaspari que eu ainda não terminei de reler tem que ficar à mão. Ela é uma negociadora dura, mas a gente vai se entendendo.
*
*******
*
Quer saber? Esses probleminhas por causa da arrumação da casa são fichinha. Coisas bobas. Como diz o meu pai, isso aí sai na urina. Nesse exato momento em que eu teclo aqui, o casal do apartamento de cima está brigando com troca de ofensas pesadas, acusações de infidelidade, palavrões e sons de objetos quebrando.
*
Sei não, acho que em algum momento, neguinho tem que perceber que tem alguma coisa errada com o relacionamento. Que fique bem claro, algum momento antes desse que eu estou ouvindo aqui em cima. Agora acabou de fazer um barulho parecido com o prato de uma bateria, talvez seja alguém jogando uma baixela, ou uma bandeja.
*
Já ouvi dizer que muitos casais resolvem seus problemas no quarto. Não sei. Acho que pode ser uma boa mas, se não for no quarto, que ao menos seja na sala, onde não há tantos objetos quebradiços ou cortantes. Definitivamente, não se deve discutir a relação na cozinha. Pensem nisso enquanto eu ligo pro síndico. Ou pra polícia.
*

23 de ago. de 2009

Knocking on heaven's door

Da Silva, você não tem jeito...
*
Lá vou eu nesse domingo, fazer mais uma tentativa de direcionar essa alma corrompida para o caminho da luz. Depois de algumas esquivadas aqui e ali, eu sei que não vai dar pra escapar, a patroa já bateu o pé e decretou que vamos à missa, doa a quem doer.
*
Notem bem, eu não tenho nada contra quem freqüenta, mas ir à Igreja, pelo menos aqui na minha vizinhança, é um dos programas dos mais indigestos. A começar pelo pároco, o padre Joubert, que me conhece desde moleque e, apesar disso (ou exatamente por isso), me detesta. Acho que ele só não pede a minha excomunhão por causa do restante da minha família, bastante carola. Principalmente a minha avó (sim, eu ainda tenho avó viva, já na casa dos oitenta), contribuinte regular das obras sociais da paróquia e respeitadíssima em toda a comunidade. Provavelmente ela vai ser meu pistolão quando eu morrer e for barrado na porta do céu. Vou ter que pedir pra chamá-la no alto-falante na hora em que o anjo da portaria não quiser me deixar entrar.
*
Reconheço que o religioso tem lá suas razões para não ir muito com a minha cara. Ele ainda deve ter fresco na memória todo o repertório de traquinagens que me quase me fez ser expulso das aulas de catecismo, como as brigas com os coleguinhas, as fugas das aulas para jogar futebol ou as caricaturas das professoras. Cheguei até a ser suspenso de algumas aulas, punição que é bastante comum nos colégios, mas que eu nunca tinha visto ser aplicada num curso de catequese. Deve ser algo inédito em mais de dois mil anos de cristianismo.
*
Na minha adolescência, durante o curso de crisma, o relacionamento com o padre azedou ainda mais por conta de minhas investidas amorosas sobre algumas menininhas da paróquia. Com direito ao desencaminhamento comprovado de algumas vocações religiosas aparentemente promissoras. Incluindo a própria patroa, que considerava fortemente a idéia de ir para um convento antes de me conhecer.
*
Meu conceito junto ao Padre Joubert não melhorou nem depois que eu virei burro velho e casei. Acho que ele deve ter percebido que, em algumas missas, eu ouvia jogos de futebol pelo walkman. Isso não costumava render maiores problemas, à exceção de umas duas ou três ocasiões em que quase xinguei o juiz ou comemorei o gol, o que me rendeu certeiras cotoveladas no baço, aplicadas pela patroa com precisão.
*
O fato é que eu realmente me esforço, mas ainda me sinto um peixe bastante fora d’água em cerimônias religiosas. Eu acredito em Deus e costumo rezar, não sou um cara ateu, mas me incomoda bastante a insistência de algumas instituições religiosas em permanecer agarradas a idéias preconceituosas e ultrapassadas, como faz a maioria das denominações cristãs. Só tento comparecer com alguma regularidade porque sei que isso é do agrado de algumas pessoas muito queridas, principalmente minha mãe e minha avó.
*
De qualquer forma, eu procuro fazer minhas orações em casa e peço, antecipadamente, compreensão divina para qualquer gafe que eu venha a cometer na Igreja. E procuro ir às missas da manhã, em horários que não coincidem com o futebol. Sabe como é, só pra garantir.
*

15 de ago. de 2009

Em nome do pai

Saudade das aulas de etiqueta paternas...
*
Eu já estava sentindo falta disso aqui, esse blog é uma cachaça. Evidentemente, foi impossível fazer a habitual postagem do último fim de semana, envolvido que estava com as festividades do Dia dos Pais. Nunca é demais celebrar o sujeito que botou este Ogro no bom caminho a base da disciplina férrea, de muito diálogo e de alguns cascudos, todos merecidos e necessários, reconheço. Sem falar nas valiosas dicas sobre o relacionamento com as mulheres, muitas das quais eu reproduzo aqui. Também não custa lembrar o segredo do perfeito passe de trivela que me rendeu muito sucesso nos campinhos de pelada.
*
A festança em torno do patriarca do clã, o Grão-Ogro, foi no melhor estilo família grande em casa com quintal no subúrbio do Rio: Churrascada, pagode e familiares e amigos acampados o final de semana inteiro. O blog ficou um pouco de lado, mas o motivo foi nobre. Valeu, pai.
*
*****
*
Eu até tive um breve momento em que poderia ter cuidado do meu cafofo virtual. Foi na manhã de sábado, quando uma vizinha passou aqui em casa para trocar umas receitas com a patroa. O problema é que ela veio acompanhada de um aprendiz de delinqüente: o filho de quatro anos de idade.
*
No exato momento, em que me sentei diante do PC, o meliante se aproveitou de uma distração da vizinha e da patroa e já estava manuseando meus CDs, uma das poucas coisas na vida sobre as quais eu tenho um zelo muito parecido com a frescura. Qualquer inspiração para escrever alguma coisa foi-se embora depois que eu vi o pilantra abrindo o meu CD do Nelson Cavaquinho com as mãos cobertas de alguma coisa gordurosa e achocolatada.
*
Tive que ficar vigiando ele até a hora da mãe ir embora. Na saída, o biltre ainda teve tempo de me lançar um olhar ameaçador, no melhor estilo isso não vai ficar assim. Estarei esperando.
*

1 de ago. de 2009

Lição de humildade do Mestre Ogro-san

Não faça das suas chuteiras uma arma
*
Putz, não adiantou nada fazer caridade nem ajudar um monte de velhinhas a atravessar a rua. Sem falar nos telefonemas pro Criança Esperança. Anos de esforço em fazer o bem em busca de alguma evolução espiritual foram por água abaixo em uma pelada de quarenta minutos.
*
Claro que a culpa maior não foi minha. Mais culpado foi quem deixou aquele garotão, na flor dos seus vinte anos, sem vícios e sem dívidas, tomar parte da nossa pelada. Qualquer observador mais atento perceberia que a escalação dos nossos times segue um padrão. Basta dizer que eu, aos trinta e três anos, fã de comida de boteco, cervejeiro contumaz, com um evidente sobrepeso, sou o jogador mais jovem, mais magro e mais saudável dentre os participantes. Aquilo não podia acabar bem.
*
E não acabou. Antes da metade da partida, enquanto a maioria dos “atletas” já pagava os pecados, com um palmo de língua de fora, o desgraçado corria como um possuído e ia fazendo um gol atrás do outro. O que não era vantagem alguma, visto que o cara não atendia os requisitos de idade mínima e de barriga mínima pra jogar conosco. Como medida de emergência, pra impedir um desastre maior, fui deslocado da meia-direita para a zaga, como o último homem de marcação.
*
E o que eu mais receava aconteceu a dois minutos do fim da partida. O sacripanta passou sem dó nem piedade pelo Serjão, o penúltimo homem da defesa, como se não tivesse corpo físico. Parecia o tal espírito do Michael Jackson que avistaram flutuando em Neverland. Sacanagem com o Serjão, ele ainda estava se recuperando da quinta cirurgia no joelho, sem falar nos trinta quilos que ele ainda precisa perder, mesmo depois de já ter perdido doze. No final das contas, só sobrei eu entre o garotão voador e o nosso gol.
*
Há momentos da vida em que um homem faz o que ele tem que fazer. Foi uma pena que as coisas precisassem chegar a esse ponto, mas eu não tive dúvida. Quando ele abriu pro lado pra me driblar para direita, dei aquele tostão clássico, com o joelho batendo na coxa do cara. É o tipo da pancada que não quebra o osso, não rompe tendão e nem lesiona músculo nem ligamento. Não machuca, enfim. Mas dói pra caralho. Pena. Foi mal, garoto. Sorry, kid. Naquele momento foi necessário, mas doeu mais em mim do que em você.
*
Vá lá, talvez tenha doído mais em você, mas ainda assim, você deve ter tirado algum ensinamento dessa situação. Você teve uma linda lição de humildade, pela qual você ainda vai me agradecer. Eu é que compliquei um pouco mais a minha ida pro céu. Mas eu acho que ainda tenho mais tempo pra me redimir do que os meus companheiros de pelada.
*