Pedindo abrigo na embaixada em Honduras, será que eu escapo da festa?
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É grave crise. Ao que parece, chegou-se a um impasse e, gradativamente, estão se esgotando todas as possibilidades de resolver o problema pelas vias diplomáticas. Não, não estamos falando de Honduras, mas da prima golpista da patroa, que marcou a festinha de aniversário do filho de um ano para esse domingão à tarde, dia e horário de futebol. E a patroa, é claro, quer que eu vá junto.
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Devo admitir que, ainda que o Flamengo não estivesse jogando, eu não morreria de amores pelo programa. Nunca fui fã de festas de criança. Nem quando eu era criança. Minha mãe ainda lembra, horrorizada, de quando eu mostrei a língua e dei um chute bem dado na canela do animador vestido de Mickey, acho que foi no meu aniversário de cinco anos. Foi desagradável, o cara apertou minha bochecha, algo que eu sempre odiei, e de forma reiterada. No final das contas, o meu kichute foi parar na canela do Mickey Mouse, que chegou a soltar um palavrão, segundo testemunhas próximas. A festa acabou mais cedo, com o aniversariante arremessando brigadeiros e trocando impropérios com um personagem de desenho animado. Bem pastelão.
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Outra coisa que me incomoda muito é a indigência da qualidade musical. Vocês podem achar que é rabugice pura, mas a criançada de hoje escuta muita porcaria. Pra começar que música infantil propriamente dita não existe mais. As crianças em geral, principalmente as meninas, já se consideram grandes demais e consomem avidamente produtos que seriam pra jovens e adolescentes. Normalmente ouvem boy bands, principalmente as da própria Disney, como os jonas brothers da vida.
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Vocês vão entender o meu drama. Eu tive oportunidade recentemente de re-adquirir uma das minhas melhores recordações de infância. Eu já tinha em LP (porra, Da Silva, tu é velho, hein?), e agora comprei em CD, a trilha sonora de um especial infantil produzido pela Globo, décadas atrás, vocês já devem ter ouvido falar, chamava-se Arca de Noé.
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Pra vocês terem idéia do quanto a gente despencou de nível cultural, basta olhar os artistas participantes. Sim, era música para crianças, mas com participação de Alceu Valença, MPB-4, Moraes Moreira, Ney Matogrosso, Marina Lima, Chico Buarque e Milton Nascimento, entre outros. Com músicas de Vinicius de Moraes. Hoje em dia, acho que é intelectual demais até pra muitos adultos.
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Pra piorar, a tal prima já manifestou a intenção de não servir cerveja no aniversário. Sabe como é, festa de criança, não seria adequado. Sei. Quer dizer que cerveja não é adequado, mas Hanna Montana é?
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De Vinicius de Morais a Jonas Brothers, putz, nós descemos muito.
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