26 de fev. de 2011

O tempo é o senhor da razão, mas não do meu guarda-roupa

Jogar fora? De jeito nenhum, ainda dá pra usar!
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Vivendo e aprendendo. A gente já se acostumou com aquele senso comum segundo o qual as mulheres, por conta da eterna vaidade feminina, ligam muito mais para roupas e sapatos e blá-blá-blá. Só que o Ogro aqui, ao longo dessa semana, acabou fazendo (mais) uma descoberta que pode revolucionar a maneira como encaramos os relacionamentos. Descobri que quem gosta de roupa, mesmo, é homem.
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Cheguei a esta conclusão ao ver Dona Patroa promovendo uma verdadeira devassa, quase uma operação da Polícia Federal, dentro da sua banda do armário. Voavam de lá de dentro roupas que eu não via há anos e mesmo algumas que eu nem sabia que ela tinha, além de outras que nem ela mesma sabia que tinha. Algumas, em bom estado, formavam uma pilha para servir de donativos a algum orfanato ou para as vítimas da chuva. Outra pilha, com as mais danificadas, iria para a reciclagem. Uma amiga dela, responsável por fazer as fantasias de um bloco carnavalesco aqui da região iria reaproveitá-las, não me perguntem como.
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Os critérios para determinar que roupas continuavam na casa e que roupas iriam para o paredão também eram bastante discutíveis. "Essa está muito velha" ou "Essa me deixa gorda", ou "Essa já saiu de moda há muito tempo, ninguém mais usa isso" eram os bordões repetidos antes da peça em questão ir para a sua pilha de destino.
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Acho isso meio cruel. Mas eu sou suspeito pra falar. No exato momento em que eu escrevo isso aqui, estou vestindo uma antiga camisa da Adidas, do Flamengo campeão brasileiro de 1987, título recentemente reconhecido pela CBF, com um atraso de quase 24 anos. Evidentemente, não posso lançar mão dos mesmos critérios utilizados por minha cara-metade. Essa camisa me deixa mais gordo? Lógico que sim, eu a comprei quando ainda era um adolescente, ela está vários números abaixo do que eu visto hoje. Além disso ela me deixa mais velho pela sua própria referência histórica. E pelo desbotamento. O vermelho e o preto da camisa estão tão anêmicos que ela mais parece uma camisa da Mangueira, com o vermelho já meio rosado e o preto caminhando a passos largos para um verde-escuro. Além é claro dela me fazer parecer ainda mais pobre, com rasgos e remendos aqui e ali, inclusive um furo medonho embaixo do braço, do qual eu me lembro sempre que comemoro um gol.
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Mais ai do cidadão que cogitar jogá-la fora. Isso já provocou até um princípio de crise, quando flagrei a Dona Patroa e a sua sogra, a Mamãe Ogra, cochichando pelos cantos, planejando jogar a camisa fora durante uma viagem que eu iria fazer a trabalho. Uma autêntica conspiração, parecia que estavam tramando um assassinato. E, de certa forma, estavam.
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Evidentemente aquilo não é só uma peça de roupa. Ela tem história, esteve comigo em muitos momentos felizes. Na final do Brasileiro de 92 contra o Botafogo, no gol do Pet que nos deu o tricampeonato em 2001 e no jogo que o Adriano matou a pau contra o Coritiba no segundo turno de 2009. A ligação dos homens com suas roupas é afetiva, e não meramente utilitária como a das mulheres com o seu guarda-roupa.
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Fico pensando se chegam aqui em casa aquela modelo magrela e aquele estilista afetado que apresentam o tal do Esquadrão da Moda, programa de tv a que Dona Patroa, costuma, esporadicamente dar uma olhada. Vai que o engraçadinho mete a mão na minha camisa pra jogar fora, dizendo que ela é feia ou cafona. Putz, não quero nem imaginar, vai levar uma mãozada no pé da orelha que vai deixá-lo um mês sem escutar Village People.
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O pior é que amanhã tem final da Taça Guanabara. É melhor eu tirar a camisa e botar logo pra lavar. Afinal, ela tem que estar seca até amanhã, para alegria da nação rubro-negra, mesmo que a camisa esteja quase verde-rosa.
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12 de fev. de 2011

O primeiro musical a gente nunca esquece

O pior é cego é o que não quer ouvir Ray Charles

O lado bom de se ter a televisão como opção única é que você, forçosamente, acaba encontrando alguma coisa boa pra ver. Forçado a manter um ajuste fiscal doméstico por conta da compra da casa nova, tive que dar um tempo nos teatros e cinemas a que eu costumava levar a Dona Patroa regularmente. Mas, para minha grata surpresa, eu acabei descobrindo que a TV nesses dias não está sendo uma derrota total, graças a Deus. Eu jurava que só me restariam os Cds para fugir do Big Brother, que é cada vez mais onipresente.
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Eis que numa madrugada insone eu topo com uma verdadeira jóia na HBO, um dos muitos filmes que marcaram a minha infância cada vez mais distante, lá nos anos 80. Aliás, ver filmes dos anos 80 na TV a cabo nos finais de semana é o que está me fazendo esquecer dos juros tresloucados do meu cheque especial. É um tal de Karatê Kid pra lá e Curtindo a vida adoidado pra cá que eu até consigo olhar para a TV sem fazer a conta mental de quantas prestações faltam para eu acabar de pagá-la.
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Mas a jóia a que eu me refiro é um musical, talvez o primeiro a que eu assisti a vida inteira e, pra ser sincero, um dos poucos de que eu gostei. É o cultuado The Blues Brothers (Os irmãos cara-de-pau, no título abrasileirado), com Dan Aykroyd e John Belushi.
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A sinopse é bastante conhecida. Era uma vez dois irmãos que, depois que um deles sai da cadeia, buscam uma maneira de impedir o fechamento do orfanato em que cresceram e que enfrenta dificuldades financeiras. Durante um culto evangélico, o ex-presidiário tem uma revelação: A melhor maneira de arrumar a grana que pode salvar o orfanato é reunir a antiga banda que eles tinham (os Blues brothers do título) para uma apresentação. E tome participações especiais e números musicais fuderosos ao longo da jornada dos dois para reencontrar o grupo. Aparecem e cantam no filme, entre outros astros do R&B, Ray Charles, Aretha Franklin e ele, o cara , o mestre, o escolhido que andou entre nós, o maior de todos, o pica das galáxias, James Brown. Putz, as meninas desculpem o linguajar do Ogro aqui, mas não dá pra definir de outra forma: é, simplesmente, do caralho.
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E olha que eu nem falei dos dois protagonistas, que demonstram entender bastante do riscado. Os dois atores tocam e cantam bem e ainda ensaiam umas dancinhas absurdamente toscas, principalmente no número final, não dá pra não rir.
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Ao fim de tudo, foi inevitável não pensar em uma coisa: Se os filmes eram tão bons, se eu não tinha dívidas e, se o Flamengo ganhava absolutamente tudo, por que os anos 80 tinham que acabar?!
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